Um Alquimista Preguiçoso Brasileira

Autor(a): Guilherme F. C.


Volume 2

Capítulo 181: Arte e cultura

Gente, só para avisar que eu venho cometendo um erro nos últimos capítulos a respeito da aparência da Xiao Shui. Eu vinha falando que o cabelo dela era azul-escuro, mas na verdade é azul-claro.

Dito isso, aproveitem a leitura.


 

Desde que pisaram em terra firme e deixaram a praia, Corina percebeu que existia certo apelo artístico na região, trazido, principalmente, na forma de esculturas. Na estrada em que o grupo foi atacado, ela viu alguns templos dedicados a oração e algumas estátuas reduzidas. Mas essa impressão ficou mais presente na cidade.

As casas, por si só, compunham uma paisagem bela e detalhista, quase dando a entender que todas foram erguidas por marceneiros e arquitetos bastante inspirados. No entanto, mesmo lá era possível encontrar alguns templos em determinadas esquinas e esculturas que traziam diferentes figuras, desde homens trajados em roupas de combate, a sábios em postura de meditação, e até monstros assustadores.

E todo esse aspecto artístico presente na região, ficou ainda mais forte quando chegaram em frente à entrada do castelo do Xogum, o líder máximo local. Falando no portal que marcava o começo da propriedade, tratava-se de uma estrutura arquitetônica peculiar, composta por duas colunas ― uma de cada lado ―, responsáveis por sustentar duas peças deitadas e com as pontas curvadas para cima. Sendo que a última, a localizada no topo, sustentava um pequeno telhado bastante característico.

Outra coisa que se destacava no pórtico de pedra, vale ressaltar, é sua coloração intensa, que dispunha de um vermelho marcante. Além do mais, na frente de cada uma das colunas existiam duas esculturas que logo ganharam os olhos de Corina. A primeira, localizada à direita, atrás dos guardas, era de uma criatura que parecia humana à primeira vista. A coisa possuía dois braços e duas pernas, ficava ereto como um homem e até usava o que aparentava ser tamancos de madeira. No entanto, seu nariz era tão comprido quanto o de um mentiroso e saltando por trás de suas costas podia ser visto um par de asas.

Porém, apesar das características singulares, a criatura vestia roupa ― sendo mais específico, um Kimono―, um chapéu, que parecia tentar imitar a palha, e portava uma lança, reforçando ainda mais sua aparência humana.

Já do lado esquerdo, a escultura ali presente não buscava esconder sua fisionomia inumana, pois se tratava de uma raposa sentada. Mas não era uma raposa qualquer. O olhar em seu rosto era esperto, denunciando grande astúcia de sua parte. E ao invés de uma cauda, ela possuía nove, abertas em um exuberante leque em suas costas, criando certa imponência.

Ambas as estátuas haviam sido esculpidas em algum tipo de pedra, por um escultor muito hábil que optou por fazê-las do tamanho de um homem adulto. Notava-se, mesmo por olhos destreinados, que um tempo significativo tinha sido gasto para construí-las. Os detalhes eram impressionantes, de forma que era possível perceber os pelos macios da raposa e as dobras na roupa da outra criatura, desconhecida por Corina.

Como sempre fazia ao chegar em um lugar novo ou quando ficava na presença de pessoas pouco familiares, a jovem de cabelo dourado tentou manter uma postura neutra, quase indiferente à situação. Mas por dentro, ficou bastante impressionada com a composição artística e como tudo aquilo parecia tão antigo e memorável.

Após Masao dizer que eles podiam seguir em frente, Corina observou que o novo chefe era o mais desmotivado de todos, apesar de ter passado a maior parte da viagem empolgado para conhecer um novo Estado. Ao que parece, a visão da escada tinha desanimado o preguiçoso. Por outro lado, ela não se impressionou com a subida e seguiu junto dos demais que saíram na frente.

Ao cruzar o pórtico de pedra protegido por soldados armados, ela se deparou com outra cena peculiar, que mais uma vez destacou o estilo artístico encontrado ali. No entanto, antes é preciso falar dos degraus que compunham a escadaria, pois a despeito de parecer uma informação irrelevante, é preciso entender que, ao que tudo indica, eles foram construídos não para permitir uma maior facilidade das pessoas na hora de subir, mas sim para comportar as novas esculturas.

Os degraus eram largos e compridos, de modo que seria possível colocar colchões em cada um e ainda sobrar espaços vazios nas bordas. No primeiro, logo depois da entrada, havia algo que se destacava bastante. E isso era a presença de duas estátuas diferentes daquelas encontradas do lado de fora.

A primeira era de um homem orgulhoso, que mantinha sua cabeça erguida e o peito estufado. Ele vestia roupas belas, repleta de detalhes que buscavam arrancar suspiros de admiração dos observadores. E em sua cintura se achava uma espada fina cuja lâmina era levemente curvada. Seus olhos estavam voltados para o alto e, mirando o fim da escalada, expressavam um enorme desejo.

Do outro lado também se encontrava a figura de um homem portando o mesmo tipo de espada. Porém, diferente do primeiro, esse vestia roupas simples, coberta por remendos. Ele estava de cabeça baixa, curvado em uma posição de saudação e respeito.

Sabendo que não adiantaria ter pressa, o grupo iniciou sua subida vagarosa. E logo no começo, Ning mostrou sua vontade inexistente de completar aquele percurso.

O Grã-alquimista começou a resmungar sem parar, perguntando que tipo de gênio tinha planejado fazer uma casa em um lugar tão alto e por que fizeram degraus tão compridos. Segundo ele, era só para os bobalhões andarem mais.

Xiao Shui, sabendo que se o deixasse assim ele reclamaria sem parar, o mandou ficar quieto e continuar subindo de boca fechada. E isso até funcionou no início, mas, depois de alguns instantes, o resmungão voltou a falar e pediu para a colega o carregar, alegando que se chegasse cansado para ver o Xogum, seria falta de educação.

Obviamente, Shui não caiu em sua artimanha. E por causa de seus pedidos ultrajantes, passou a ser ainda mais severa com o preguiçoso.

Ali perto, Corina achou a interação entre os dois bastante curiosa, mas não incomum. Depois do tempo que passaram viajando juntos, ela tinha se acostumado a ver a rival dando broncas enquanto o ex-noivo aprontava alguma travessura. No entanto, a despeito do desentendimento constante, eles se davam muito bem.

O grupo continuou subindo sem muita pressa, apesar da notável ansiedade de Masao. E quando chegaram no degrau de número duzentos, mais uma vez as estátuas do começo voltaram a aparecer. Entretanto, a postura delas tinha mudado.

O homem orgulhoso, embora mantivesse o peito estufado e uma expressão valente no rosto, havia alterado ligeiramente a postura, deixando os ombros caírem. E sua boca estava um tanto aberta, indicando que a respiração havia ficado abalada diante do desafio. Em contrapartida, o sujeito do outro lado mantinha um semblante sereno enquanto olhava para os próprios pés, avançando um passo de cada vez.

Conforme subiam, novas representações dos mesmos personagens apareciam, mas em posições diferentes.

Quando o grupo chegou na metade do caminho, o orgulhoso estava curvado com as mãos apoiadas sobre os joelhos. Gotas de suor foram esculpidas em sua testa, ao passo que a expressão em seu rosto era de pura fadiga. E o sujeito simples, por outro lado, se mantinha constante, resoluto e sereno. No entanto, novas linhas de expressão foram desenhadas em seu rosto, indicando uma firmeza inquebrável.

De certa forma, Corina não podia julgar o primeiro pelo cansaço, já que estava começando a ficar esgotada. Não apenas ela, mas Shui também tinha gotas de suor brotando sobre o rosto. E o pior era Ning, que mantinha uma respiração acelerada e uma face abatida.

Os únicos que não sentiram o peso da escalada foram Xiao Qiao e Masao. Ambos continuavam avançando, sem pausas. Mas os verdadeiros sortudos eram os subordinados do comandante, que puderam ficar na entrada, ao lado dos demais soldados.

Após alcançar o degrau de número setecentos e cinquenta, as figuras voltaram a aparecer.

Dessa vez, o orgulhoso estava ajoelhado, com a camisa aberta e a boca escancarada, lutando para continuar respirando. A espada já não podia ser mais encontrada em sua cintura ― um detalhe curioso que chamou a atenção de Corina, pois ela tinha visto a arma caída a alguns metros abaixo.

Já o sujeito simples era o mesmo de sempre: resoluto, imbatível e constante. Mas agora ele tinha a cabeça erguida, olhando para o topo do monte.

Conforme avançavam, a jornada foi ficando mais lenta. Os dois Espirituosos não demonstraram sinais de exaustão, porém os mais jovens foram obrigados a fazer uma pequena pausa. E no caso de Ning, ele estava quase tão mal quanto o orgulhoso.

Depois de alguns instantes descansando, o grupo voltou a subir. E então, eles enfim alcançaram os últimos degraus que traziam as representações finais dos dois sujeitos.

O orgulhoso, vencido pelo calor e exaustão, achava-se deitado sobre a escada, com a camisa completamente aberta e o corpo coberto de suor. Apesar de estar se arrastando, ele não tinha mais força para continuar avançando.

Do outro lado, a situação era diferente. O homem simples tinha conseguido terminar o percurso sem derramar uma única gota de suor. Ele estava no último degrau, olhando para baixo, com a cabeça curvada em uma posição de agradecimento e respeito.

E mais uma vez, Corina foi capaz de traçar um novo paralelo. Pois Xiao Ning não tinha conseguido terminar a escalada e precisou de ajuda para chegar ao final. Mas não sem ouvir as queixas de Shui.

Ah! Você está todo suado ― dizia ela enquanto o puxava pelo braço. ― Mexe as pernas, porque eu não vou te carregar no colo ― resmungava.

Quando chegou ao fim do cansativo percurso e olhou para trás, Corina ficou impressionada com a visão que teve. Antes de mais nada, é preciso dizer que a imagem dos mil degraus enfileirados despertava uma profunda sensação de conquista, pois dali, do topo, ficava evidente que essa não tinha sido uma jornada fácil.

Entretanto, sem dúvida alguma, a paisagem que mais causava impacto era a do enorme e infinito Vazio, que pintava o plano de fundo do Estado, serpenteando ao longo das bordas do Reino, ameaçando invadir aquelas terras e devorar tudo e todos que ali habitam.

De fato, do alto daquele monte, que proporcionava uma visão desobstruída da outra face do Reino da Lua Verde, ficava claro o porquê de chamarem tal nação de “O último pedaço de terra”, um termo que Corina escutava com certa frequência em sua Família. A grande parede que engolia o céu e o mar, e marcava o fim do mundo, possuía uma divisa tão próxima com o Reino que em algumas partes era possível chegar a pé, pelo solo.

Decerto, ainda existia uma boa porção de oceano separando esse pedaço de terra, mas em algumas partes, “O Vazio” havia invadido as fronteiras do território, provocando cortes perceptíveis em partes de sua extensão.

Durante a viagem pelo mar, ela pôde observar bem o colosso que era aquele fenômeno misterioso. Entretanto, a vista que estava testemunhando agora era diferente daquela que teve de dentro do barco, assim como a emoção que sentia. Do alto do monte, parecia que a noite e o dia haviam chegado a um acordo para que pudessem conviver em harmonia, sem a necessidade de um se esconder enquanto o outro reinava. E isso era belo de uma maneira indescritível.

Por um instante, ela parou para admirar a paisagem que, com toda certeza, ficaria para sempre marcada em sua memória. Mas depois de alguns segundos, sentia-se pronta para seguir em frente. Contudo, foi obrigada a esperar no mesmo lugar e tudo por culpa daqueles dois.

Todos já haviam terminado a “escalada” e como era de se esperar, Masao e Xiao Qiao sequer se esforçaram. Porém, tal realidade era muito diferente para Ning. Próximo do fim, o preguiçoso estava quase se jogando no chão e desistindo da subida, apesar de não aparentar estar tão cansado quanto dizia estar. De fato, ele suava bastante e ofegava feito um cachorro sedento com a língua para fora. Mas seus olhos continuavam espertos e altivos, iguais aos de um oportunista.

Porém, a despeito do possível exagero do chefe folgado, Shui ainda o ajudou a terminar a subida, quase o arrastando pelo resto do caminho. A jovem de cabelo azul-claro, quase branco, e estatura mediana, reclamava sem parar por causa da tarefa vergonhosa. Contudo, ainda assim, seguiu ajudando o preguiçoso.

Tal interação foi bastante curiosa para Corina, pois, por mais que a rival reclamasse, ela era sempre a primeira a se candidatar e a chegar para ajudar Ning.

Seja como for, a Despertada de dezesseis anos e olhos verde-claros decidiu mudar de foco enquanto aguardava. Dessa forma, virou-se para olhar o castelo do Xogum. E... a construção não era tão memorável quanto havia imaginado.

Era evidente que se tratava de um edifício belo e dotado de conceitos arquitetônicos únicos, que garantiam um charme pessoal e nobre ao local. Entretanto, tratando-se de dimensões, não parecia ser algo colossal. É claro que seus olhos podiam estar a enganando, afinal, dali, só conseguia ver a fachada da mansão. Mas a parte frontal, citando o comprimento, não era diferente dos prédios oficiais da Família Xu. E chegava, até mesmo, a ser mais baixo, já que claramente não passava dos dois andares de altura.

Todavia, tratando-se do conceito estético, nessa parte o castelo se destacava. A fachada era semelhante às casas que o grupo encontrou na estrada, era feita de madeira muito bem preservada e que trazia uma cor forte e marcante. Contudo, alguns detalhes extras se destacavam, como o fato de existir uma varanda com cobertura que circundava toda a propriedade.

O espaço aberto, quando somado ao belo jardim e canteiros de flores cercados por arbustos podados com esmero, formava uma composição agradável e leve, algo que era reforçado por um barulho distante do que Corina julgou ser o de água corrente.

Entretanto, outra coisa que se destacava eram as duas novas esculturas estacionadas na lateral do pórtico, uma de cada lado. E desta vez, as figuras traziam a imagem de dois homens. O da esquerda era o sujeito humilde da escada, parado em uma posição majestosa, segurando sua espada curva que apontava para o alto. A segunda representava um homem grandioso em todos os aspectos, com ossos largos, braços compridos e um olhar desafiador.

Quando Shui enfim conseguiu arrastar Ning para cima, o grupo logo foi guiado para dentro do castelo. O preguiçoso quis descansar um pouco, mas Masao estava ansioso demais para esperar, ainda mais depois de perder tanto tempo.

Seguindo o Comandante da Ordem Pública, o bando atravessou o pórtico e saiu em um pátio aberto que se encontrava cercado pela suntuosa construção e que contava com uma varanda interna.

O átrio, que dispunha de um chão gramado e reto, achava-se ocupado por meia dúzia de praticantes descontraídos portando as típicas espadas curvas. Mas quando viram o comandante se aproximar, eles pararam a conversa e foram correndo recebê-lo.

Porém, Masao estava sem tempo para as bajulações daqueles homens e por isso foi logo dizendo:

― Estes são meus convidados, por isso, trate-os com respeito. Eu preciso me encontrar com o nosso Xogum. Enquanto isso, faça-os se sentirem à vontade.

Após dizer isso, ele informou a Ning e aos demais que iria imediatamente se encontrar com o seu líder supremo para anunciar a chegada do Grã-alquimista e seu bando. Nesse meio tempo, os convidados do distante Império Dourado deveriam esperar no pátio até que alguém viesse para alocá-los. E então, ao concluir o que tinha para falar, partiu a passos largos.

 


Nota do autor

Eae, como vão? Espero que bem?

Então, queria me desculpar pela irregularidade dos lançamentos nessas últimas semanas.

Sinceramente, não sei o que se abateu sobre mim, mas tenho me sentido muito cansado ultimamente, não física, mas mentalmente. Normalmente eu não falaria disso aqui, mas achei plausível trazer uma explicação.

Esses dias tem sido bastante difíceis. Já não escrevo faz algumas semanas e nem mesmo tenho entrado no Discord e coisas do tipo.

É um desânimo imenso que tem me sugado. Por causa disso tenho cometido alguns erros bobos, tanto na hora de escrever quanto no momento de revisar.

Eu espero, de verdade, conseguir voltar a me organizar e escrever. Mas até lá, espero que compreendam quando um capítulo acabar saindo atrasado. E se encontrarem algum erro, podem falar que irei corrigir imediatamente.



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